Entre monstros e fantasias: a distorção da realidade, o trauma infantil e o medo na graphic novel "O monstro debaixo da minha cama", de Luckas Iohanathan

Abstract

As graphic novels, enquanto linguagem artística híbrida, têm demonstrado notável potencial para abordar questões sociais complexas, como violência doméstica, trauma infantil e exclusão social. Nesse sentido, este artigo analisa a construção da personagem Lucy, da obra “O Monstro Debaixo da Minha Cama”, de Luckas Iohanathan, com o objetivo de compreender como o trauma molda sua percepção de mundo e comportamentos. A metodologia utilizada baseou-se em análise qualitativa e interpretativa, com ênfase na linguagem verbal e visual da narrativa gráfica. O estudo examinou o papel dos elementos imagéticos, como o uso das cores, os enquadramentos, os balões de fala e as onomatopeias na representação do medo, da opressão e da resistência da protagonista. As reflexões de Foucault (1987) contribuíram para entender os dispositivos de poder e controle que envolvem Lucy, enquanto os apontamentos de Butler (2019) forneceram subsídios para compreender a performatividade do corpo em contextos de vulnerabilidade, ao passo que os postulados de Goffman (1989), por sua vez, auxiliaram na análise das interações sociais e das máscaras utilizadas por Lucy para sobreviver ao trauma. A análise revelou que a linguagem dos quadrinhos não apenas sustenta a narrativa, mas também amplia a expressividade do sofrimento e da resistência da personagem. O desfecho da história, marcado pela morte física e simbólica do monstro-pai e pela postura heroica da protagonista, evidencia um processo de emancipação subjetiva. Conclui-se que a graphic novel, ao mesclar texto e imagem, não apenas denuncia o abuso sexual infantil, mas também oferece ao leitor uma experiência estética e crítica profundamente engajada com a realidade social.