Medicalização da vida: Uma análise de discurso da obra "Admirável Mundo Novo"

Abstract

O fenômeno da medicalização da vida tem se tornado cada vez mais alvo de debates na contemporaneidade. Recorremos em diversas situações e momentos da vida a um médico, psiquiatra ou psicólogo, quando se está doente, mas sobretudo, a procura por esses profissionais também ocorre com o intuito de querer estar bem ou ficar ainda melhor. Desta forma, pretende- se aqui, discutir este fenômeno a partir do livro ‘Admirável Mundo Novo’, de Aldous Huxley, publicado em 1932. Este trabalho objetiva analisar o papel que a medicalização exerce na vida cotidiana dos sujeitos inseridos na narrativa, a partir das reflexões produzidas no ato de consumir medicamentos e exercer práticas médicas, observando qual o lugar que ocupam a partir do seu uso e incorporação. Para isso, utiliza-se como perspectiva teórico-metodológica a Análise de Discurso de abordagem francesa, que considera contribuições do materialismo histórico, da ideologia, da linguística, e da teoria do discurso. A partir destas análises, é possível notar que ao adotar seus posicionamentos, a maioria das personagens age em conformidade com a ideologia do corpo social, que possui valores e normas orientadas pelo princípio da comunidade, identidade e, principalmente, estabilidade. Vivem em sociedade a partir de um poder estatal que se coloca muito maior do que os indivíduos, sem que eles possuam nenhuma agência. Os medicamentos e as drogas, neste contexto, fazem parte de um arsenal para não lidar com o sofrimento ou o desconforto gerado pela vida, a partir de uma hiper patologização que reforça o controle social. Já os discursos em torno da saúde e da doença na narrativa, são elementos relevantes para a compreensão do que se entende como patológico e, consequentemente, passível de ser medicalizado, a partir de uma dualidade entre civilização e selvageria, onde este último seria marcado por um atraso ao qual o mundo civilizado já ultrapassou. Assim, o discurso de avanço da ciência coloca em questão o endosso da medicina em práticas que até então, não eram de seu domínio, dentre elas como se deve envelhecer, dormir, se divertir, e desejar. Ao explorar a medicalização e os posicionamentos dos personagens, percebe-se a necessidade de problematizar o fenômeno para que seja possível estabelecer novas compreensões acerca da saúde e da doença, assim como repensar práticas “desmedicalizantes”.