Transferências de águas interbacias amortecem os impactos da competição entre peixes no semiárido?

Abstract

O sucesso adaptativo de espécies exóticas sobre nativas, pode estar atrelado ao fato de que estas possuem características funcionais e taxonômicas que podem se sobrepor às das espécies nativas, gerando assim, através da competição, a perda de características funcionais e funções ecológicas, como a substituição de espécies e a diminuição da biomassa nativa. Atualmente o Nordeste do Brasil está passando por um projeto de Transferência de águas interbacias, o Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF), à vista disso, faz-se necessária a investigação de como essas intervenções antrópicas interferem nas estratégias de coexistência utilizadas pelas populações de peixes para garantir a sobrevivência das espécies da comunidade. Sendo assim, esse trabalho tem como objetivo verificar as estratégias de coexistência entre Geophagus brasiliensis (Quoy & Gaimard 1824), espécie nativa da região e Oreochromis niloticus (Linnaeus, 1758) (espécie exótica) em um reservatório antes e depois de ter recebido a influência da transferência de água interbacias do São Francisco, assim como constatar possíveis mudanças na estrutura trófica do ambiente pós transposição. O estudo foi realizado no reservatório Argemiro de Figueiredo. A amostragem da comunidade de peixes foi realizada em coletas padronizadas (2014/2015) e (2020/2021), sendo uma amostragem no fim da estação de seca, e uma no final da estação chuvosa. Sendo realizados dois arrastos e seis lances de tarrafas, em um ponto próximo ao barramento. Foram utilizadas abordagens de ecologia trófica, identificando os itens alimentares presentes até o menor nível taxonômico possível, e ecomorfologia, da qual, foram mensurados noves medidas morfológicas para compor seis índices morfológicos. Foi possível constatar que antes da transposição, os nichos tróficos de G. brasiliensis e O. niloticus apresentavam uma alta sobreposição, e que após o transvase, essa sobreposição diminuiu significativamente, onde G. brasiliensis adotou uma estratégia mais especialista e O. niloticus uma dieta mais generalista/oportunista em ambas as estações, também foi possível constatar que a sobreposição dos nichos tróficos dessas espécies pode está mais associada à menor variedade de recursos antes da transposição. As espécies ampliaram seus nichos tróficos a partir da exploração de mais recursos disponíveis, esse fato pode ter sido facilitado pela transposição do rio São Francisco, dado o possível carreamento de material alóctone para o reservatório, aumentando a gama de recursos para as espécies residentes, ou do possível aumento da turbidez pela maior concentração de nutrientes facilitando a persistência de poucas espécies de macroinvertebrados, macrófitas, fitoplâncton e zooplâncton.