dc.description.abstract |
Este trabalho investiga eventuais aspectos, que se julgam desafiadores, presentes no
diálogo A República de Platão, mais precisamente a partir da reiterada recomendação
platônica de exclusão dos poetas imitadores do projeto de concepção de sua cidade
perfeita. A pesquisa, de natureza bibliográfica, e com base na leitura, sobretudo, do
Livro X desta obra, inventaria pistas, nos diferentes momentos do seu discurso, que
remetem à contradição, em especial a partir de duas categorias de análise propostas:
a política e estética. A hipótese central a ser investigada é a de que muitas das estratégias das quais Platão lança mão, na escrita deste diálogo, para acusar e condenar
os poetas – por uma série de razões que perpassam aspectos estéticos, políticos e
até morais – são utilizadas por ele na consecução de seu jogo dialético-argumentativo.
Eis, portanto, o que aqui se vislumbra como desafio. Neste sentido, importantes são
as contribuições de comentadores, tais como: Pereira, Havelock, Jaeger, além de Cornelli. Com efeito, a análise dos dados aponta para algumas conclusões, tais como: 1)
a exclusão dos poetas que cultivam a poesia mimética do universo da proposta de
cidade perfeita platônica, tidos como imitadores e maus exemplos, elimina um elo fun damental da trindade grega, ideário de constituição milenar desta nação: a voz do
povo, o senso comunitário, cuja essência está na poesia falada; 2) ao se esconder
e/ou fundir a sua voz, estratégia bastante reiterada nos diálogos, nas inúmeras vozes
de seus interlocutores, Platão se utiliza do mesmo recurso que condena, segundo ele,
nos poetas imitadores: o que denomina de narrativa mista; 3) o controle ostensivo do
produto poético – o que, o como, bem como a quem dizer o que tem de ser dito – fere
frontalmente a essência da liberdade e, com efeito, do pensar do povo grego; 4) o
explícito e reiterado ataque ao elemento do mito vai de encontro, no pensar platônico,
às inúmeras referências que ele faz, durante todo o diálogo, para projetar a sua cidade
perfeita. Por fim, na tentativa de instauração de seu projeto político e educativo de
uma cidade perfeita, inserido em um movimento do pensamento ocidental para um
novo paradigma de pensamento – de uma paideia milenarmente concebida a partir de
um ethos de vida do povo grego comandado pela força da voz poética para o pensar
racional e sistemático de base filosófica – Platão exagera na dose, ao recomendar a
exclusão dos poetas, estes que, milenarmente, por vias orais, eram educadores. |
pt_BR |